Igor Fonseca, escritor e roteirista formado pela Escola de Cinema Darcy Ribeiro, não hesita em mergulhar nas profundezas da alma humana. Suas narrativas são marcadas pelos desafios da adolescência e pelas complexidades que envolvem as dicotomias do cristianismo. Os personagens criados por ele são espelhos de jornadas familiares, refletindo a culpa cristã e explorando o body horror dentro dos espectros da temática e protagonismo LGBTQIAP+.
Em sua obra “Pai Nosso”, o autor nos transporta para um horror gótico contemporâneo. Nesse universo repleto de intrigas, as fronteiras entre o bem e o mal se dissolvem, e as linhas que separam santidade e pecado são apagadas. No entanto, Igor Fonseca não se limita ao terror. Em “O Novo Chris”, ele nos presenteia com uma história mais leve. Aqui, o filho do Todo-Poderoso ganha vida em um drama adolescente que se passa no ensino médio. Nas palavras do leitor Sandro Christy: “Igor apresenta uma obra divertida, inteligente, com excelentes pitadas de humor, cultura pop e até mesmo um suspense”.
Em uma entrevista exclusiva concedida ao Portal Cataprisma, Igor Fonseca compartilha detalhes sobre seu processo de escrita e sua trajetória. Acompanhe a entrevista completa abaixo.
Tête-à-tête com Igor Fonseca
1) Conte um pouco sobre o seu envolvimento com a literatura.
Sempre gostei de ler, acho que meu primeiro contato foi lendo os quadrinhos da Turma da Mônica e dos X-Men, depois com os livros da coleção vagalume. Mas acredito que meu primeiro contato com literatura de fato, entendendo o movimento artístico, foi com Noite da Taverna do Álvares de Azevedo. Também foi meu início da paixão pelo gótico. A partir daí eu li tudo: Edgar Allan Poe, Drácula, Mary Shelley, Morro dos Ventos Uivantes, Jane Eyre e por fim fiquei obcecado por Anne Rice e as Crônicas Vampirescas. Do mesmo modo que os adolescentes andavam com Crepúsculo, eu andava com Entrevista com o Vampiro debaixo do braço.
Nunca pensei que seria capaz de escrever um livro, uma história com começo, meio e fim. Achava isso uma tarefa impossível. Apesar de gostar de escrever, de ser elogiado pela minha escrita, eu fui sendo levado. Quando fiz o teste de aptidão profissional o resultado foi escritor. Quando fiz meu mapa astral, o astrólogo falou que eu deveria ser escritor. Estudei cinema e a parte que mais me atraiu foi a parte de roteiro. Até que depois que eu saí da faculdade de roteiro eu me senti relativamente preparado para escrever minhas histórias.
Minhas histórias sempre nascem do pessoal, de algo que me incomoda, de algo que vivi, e a partir daí eu ficcionalizo essa parte minha até formar uma história. Então, eu sempre espero que elas façam meus leitores refletirem sobre isso. Sobre como esses incômodos dominam e transformam as nossas vidas, para melhor ou para pior.
2) Teve dificuldades dentro do meio literário que precisou superar? Qual foi sua maior evolução enquanto escritor?
Como qualquer autor independe, acho que a parte mais difícil é você ter que fazer tudo sozinho. Além de escrever um livro e estar satisfeito com ele, que já acredito ser uma tarefa hercúlea. A divulgação é sempre uma parte muito desgastante quando você tudo recai no ombro de uma pessoa só.
Acho que quanto mais escrevo mais minha prosa melhora. É bom ver essa evolução; me ver chegando mais perto da prosa que eu quero ter. Cada frase, cada palavra fica mais fácil de ser colocada no lugar correto, ver as frases se encaixando melhor, a fluidez; contar as histórias como elas devem ser contadas.
3) Quais gêneros você costuma trabalhar e quais temáticas são recorrentes em suas narrativas?
Religião é o tema mais recorrente nas minhas obras. Sou gay e fui criado por uma família cristã, então acho que religião foi quase como uma força antagônica durante boa parte da minha vida. E todas as histórias que fiz passam por essa minha vivência. Tanto no meu livro adolescente O Novo Chris como no Pai Nosso, meu livro mais recente, que é um horror gótico, fala sobre essa temática de diferentes maneiras.
Como escritor meu sonho é me aventurar por vários gêneros. O Novo Chris é um YA de ensino médio e Pai Nosso é um horror gótico contemporâneo.
4) Quais obras já produziu e o que o leitor irá encontrar assim que adquirir as histórias?
O Novo Chris é um YA sobre um novo messias passando pelo ensino médio. Religião e adolescência são as forças motores desse livro, quase antagônicas. Nele eu discuto sobre o que é a puberdade em nosso país extremamente diverso e religioso. Como essas forças atuam numa época em que os hormônios e os desejos estão à flor da pele. Numa época em que muito do nosso caráter é formado.
Já Pai Nosso, meu livro mais recente, é um horror gótico contemporâneo que fala sobre culpa cristã. Um livro que se passa em Ouro Preto sobre um jovem padre que presencia uma caso de abuso e passa a ter sua fé testada de todas as maneiras possíveis. Um livro com narradores confiáveis e não confiáveis, bem atmosférico com uma prosa que reflete o pano de fundo do barroco mineiro.
5) O que pode nos contar sobre a concepção das suas ideias e seu processo de escrita?
Minhas ideias sempre nascem de um desconforto ou experiência pessoal, aí eu começo a criar em cima delas. O Novo Chris foi por ser uma adolescente gay que estudou em uma instituição católica. Então os dogmas religiosos sempre fizeram parte da minha vida. Pai Nosso a mesma coisa, nasceu de uma pergunta. E se eu virasse padre, assim como eu queria na minha pré-adolescência? Pai Nosso fala muito disso, desejos reprimidos, para onde eles saem? O que acontece com eles em ambientes tão repressores? O que acontece quando deixamos uma parte inerentemente nossa escondida, trancafiada?
Quando estou escrevendo sobre algo, eu começo a ler livros que se assemelham às minhas narrativas, ou que possuem uma prosa que eu acho que se encaixaria na minha narrativa. Além disso, existe uma pesquisa com pessoas relacionadas a essas histórias. Pai Nosso, por exemplo, eu tive um amigo ex seminarista, que saiu do seminário por ser gay. Então eu pude tirar dúvidas sobre os ritos, sobre como os padres gays são tratados, como os casos de descobertas sexuais são tratados num lugar de repressão. Então sempre tem alguém para me dar um suporte específico.
Espero que meus livros façam meus leitores pensarem, fiquem desassossegados. Pensarem no mundo em que vivem, pensarem nos dogmas que nos cercam, e ao mesmo tempo, quero que eles sejam entretidos. Gosto quando os personagens não são perfeitos, são cinzas, cheios de erros, que faz com que os leitores os amem e também os odeiem. Gosto quando os leitores terminam Pai Nosso e ficam pensando depois de um tempo, que não seja só um entretenimento que dá susto e aterrorize, mas que mostre um pouco do nosso mundo por uma luz diferente, mostre que o horror está à nossa volta, e que eles estão sendo avisados sobre isso.
Todas as obras de Igor Fonseca podem ser adquiridas na plataforma da Amazon.
Entrevista por Filipo Brazilliano Artes de Vitrine por Filipo Brazilliano